O POVO
BRASILEIRO ACORDOU
Percival Puggina
Não
adiantou a enorme e persistente campanha para afastar os brasileiros das urnas.
Poucas coisas são tão consensuais entre nós quanto a inconfiabilidade das
eletrônicas em uso no país. Descrédito total! O solene depoimento de meia dúzia
ou mais de ministros do STF e do TSE só agrava a situação. Quem confia nessas
cortes? Pois mesmo assim, olhando de soslaio, com um pé atrás, os eleitores
brasileiros foram às seções de votação no dia 7 de outubro. O pleito era sua
bala de prata! Era a possibilidade de usar a minúscula fração de poder nas mãos
de cada cidadão. Apenas nove horas, das 8 às 17. Mas durante esse curto espaço
de tempo podia mandar quadrilheiros para casa e para a justiça, renovar o Congresso
Nacional e evitar o retorno de criminosos aos locais dos crimes.
O jogo
foi pesado. Havia na sociedade uma firme disposição de renovar o parlamento,
suprimindo o foro privilegiado dos corruptos e despachando os coniventes e os
omissos. Confrontados com essa notória intenção dos eleitores, os parlamentares
avaliavam suas chances e muitos já buscavam alternativas pessoais longe do
poder. Subitamente tudo mudou. Impulsionados pela oportunidade de ouro
concedida pelo STF ao impedir o financiamento empresarial no modo como o fez,
os parlamentares criaram o Fundão de Campanha com nosso dinheiro e o ratearam
entre si. Em seguida, encurtaram todos os prazos, com o intuito de dificultar o
trabalho dos novos postulantes. Para estes, apenas 45 dias de campanha, horário
gratuito reduzido, publicidade dificultada e csteio por “vaquinha”. Enquanto os
novatos corriam por uma pista cheia de obstáculos, os detentores de mandato
colhiam os frutos da generosa distribuição de emendas parlamentares. A vida
lhes voltou a sorrir e o céu de Brasília se fez novamente azul. O STF é bom e
Deus existe, talvez dissessem blasfemando.
Quem
haveria de imaginar que o povo, contra tudo e contra todos, saísse de casa,
mandasse às favas a desconfiança nas urnas e levasse a cabo sua tarefa
promovendo a maior renovação do Congresso Nacional em vinte anos? O bom povo
brasileiro fez o que lhe correspondia. De cada quatro senadores que tentaram
reeleição, três não conseguiram; das 54 vagas em disputa, 46 serão ocupadas com
novos nomes! Na Câmara dos Deputados, dos 382 parlamentares que tentaram a
reeleição, 142 foram destituídos de seus mandatos. A renovação atingiu mais da
metade da Casa. O número de conservadores e liberais eleitos marca o que a
imprensa militante qualificou como um inusitado giro à direita. Infelizmente,
alguns inocentes foram descartados com a água desse banho.
É claro
que esse giro se fez ao arrepio da grande imprensa. Nesta, viceja, cada vez
mais forte, um rancor em relação às redes sociais. Acostumados a infundir suas
convicções a um público dócil e cativo, muitos formadores de opinião viram o
próprio poder se diluir, quase atomizar-se, na caótica democratização das redes
sociais. Os grandes jornalões, as principais revistas semanais, a Vênus
Platinada e os militantes globais do “progressismo” debochado e do esquerdismo
anacrônico, em vão tentaram conter o sucesso eleitoral de Bolsonaro. Em vão
queimaram o filme perante seu público. Em vão promoveram o presidiário. Em vão
tentaram vender picolé de chuchu por chicabom. A nação, preferindo escolher o
próprio caminho, recusou o buçal insistentemente apresentado.
O povo
brasileiro acordou em tempo de salvar o país e os próprios dedos, que os anéis
já lhe levaram.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do
Brasil. integrante do grupo Pensar+.