quinta-feira, 4 de outubro de 2018

OPINIÃO

                                Um mesmo olhar no Evangelho

 Mario Eugenio Saturno


Jesus veio ao mundo anunciar uma mensagem de Deus, a boa mensagem, em grego, eu aggelion, ou Evangelho. Os escritos que recebem o nome de Evangelho de Jesus Cristo segundo Mateus, Marcos e Lucas são também chamados de sinóticos, do grego, mesma visão. Nesses, a palavra “evangelho” é encontrada doze vezes, das quais quatro em Mateus (4,23; 9,35; 24,14; 26,13) e oito em Marcos (1,14.15; 8,35; 10,29; 13,10; 14,9; 16,15). A palavra vem sempre da boca de Jesus ou então se refere à sua pregação. Há uma exceção, em Marcos (1,1). Em Lucas prevalece o verbo “evangelizar”, presente dez vezes (1,19; 2,10; 3,18; 4,18.43; 7,22; 8,1; 9,6; 16,16; 20,1) e reencontrado nos sinóticos apenas em Mateus (11,5).



Jesus diz que a sua palavra realiza a consolação anunciada pelos profetas (Is 61,1.3) e particularmente a libertação reservada aos pobres. Ele é portador da grande notícia da intervenção definitiva de Deus em benefício do povo aflito: “O tempo já se cumpriu, e o Reino de Deus está próximo. Convertam-se e acreditem no Evangelho” (Mc 1,15). O fato de destacar o verbo “cumprir” assinala diversos períodos ou etapas da história salvífica. 



A palavra de Jesus, relatada pelos escritores sagrados, concretiza uma identificação entre o que Jesus diz, faz e é. “Quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la, mas, quem perde a sua vida por causa de mim e do Evangelho, vai salvá-la” (Mc 8,35). Fica evidente a identificação entre o evangelho e Jesus, e mais ainda: “quem tiver deixado irmãos, irmãs ou mãe [...] por causa de mim e por causa do Evangelho” (Mc 10,29). Portanto, o evangelho é mais do que uma nova doutrina, o próprio Jesus tornou-se portador de toda novidade, sendo portador de si mesmo, ele é o Evangelho.



No final do século II e o início do século III, pelos testemunhos de Tertuliano, de Clemente de Alexandria, de Orígenes que se juntam aos primeiros códigos do século IV, os Evangelhos foram denominados “segundo Mateus”, “segundo Marcos” e “segundo Lucas”.



O Cânone de Muratori (por volta de 160) menciona Marcos e Lucas, mas não Mateus. O Cânone Muratori é uma cópia da lista mais antiga que se conhece dos livros do Novo Testamento. Foi descoberta na Biblioteca Ambrosiana de Milão por Ludovico Antonio Muratori (1672 – 1750) e publicada em 1740.



Irineu (por volta do ano 180) fala de Mateus, que escreve o evangelho em hebraico, enquanto Pedro e Paulo fundavam a Igreja de Roma, menciona Marcos, que escreve o evangelho depois da morte dos dois apóstolos, e Lucas que, como discípulo de Paulo, transmitiu por escrito a doutrina do mestre.



Então, em 1776, um pesquisador alemão chamado Johann Jakob Griesbach (1745-1812) publicou, em Halle, a obra “Synopsis evangeliorum” (Sinopse dos evangelhos). Foi a primeira vez que se utilizou o termo “sinótico” aos escritos dos três primeiros evangelhos. A ideia de Griesbach era a de elaborar uma edição de Mateus, Marcos e Lucas, que permitisse abranger “os três num único olhar”.



Essa intervenção da sinopse no século XVIII contribuiu enormemente para instaurar a era da crítica evangélica.



Mario Eugenio Saturno (cientecfan.blogspot.com) é Tecnologista Sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano.